Basta estar vivo para envelhecer. Esse processo é natural e todo e qualquer ser humano está sujeito a ele. Contudo, devido a diversos fatores socioeconômicos e políticos, outro fenômeno vem ocorrendo em vários países: o envelhecimento populacional.
É claro que esse fenômeno acontece em ritmo e maneira diferente entre as nações, a depender de uma série de aspectos. Porém, é possível considerar que o envelhecimento populacional já é uma realidade no mundo.
Segundo o relatório World Population Prospects, elaborado em 2019 pela Organização das Nações Unidas (ONU), estima-se que em 2050 haverá duas pessoas com mais de 65 anos para cada uma entre 0 e 4 anos no mundo.
Dessa forma, com o crescimento da população idosa, mecanismos para garantir que todos vivam a senioridade com dignidade e não tenham os seus direitos fundamentais violados precisam ser elaborados. Por isso, neste texto do Equidade vamos tratar sobre o envelhecimento populacional e como podemos lidar com isso.
O projeto Equidade é uma parceria entre o Politize!, a Civicus e o Instituto Mattos Filho voltada a apresentar, de forma simples e didática, os Direitos Humanos e os principais temas que eles envolvem, desde os seus principais fundamentos e conceitos aos seus impactos em nossas vidas. E então, preparado(a) para entender o que é o envelhecimento populacional e como os países lidam com isso? Segue com a gente!
Se quiser, escute nosso podcast complementar ao assunto do texto:
O que é o envelhecimento populacional e o que ele representa?
O prolongamento da vida é um assunto de interesse da humanidade. Quem nunca teve a curiosidade de saber se a imortalidade é uma possibilidade? Seja de maneira científica e factível ou apenas uma ideia passageira, o fato é que viver por mais tempo é uma aspiração da sociedade.
Atualmente, de uma forma geral, essa aspiração tem se tornado realidade. Isso porque o aumento da população idosa, em decorrência do aumento da expectativa de vida, é uma tendência mundial que já está acontecendo e, ao que tudo indica, irá se intensificar nas próximas décadas. Mas, para entendermos o que significa o envelhecimento populacional, é importante primeiro entendermos o que significa o envelhecimento.
Como apontam os especialistas em geriatria Edgar Nunes, Flávia Lana e Simone de Paula (2010), o envelhecimento, no sentido biológico, pode ser considerado como uma involução das funcionalidades do corpo, afetando os sistemas fisiológicos. No entanto, esse processo não impede que a pessoa tenha uma vida próspera, ativa e independente.
Isso significa que de maneira direta, o envelhecimento está relacionado com o avanço da idade. Nesse sentido, o envelhecimento populacional é o aumento do número de pessoas idosas em comparação ao número de pessoas jovens.
Em outras palavras, o envelhecimento populacional é a ampliação da quantidade de indivíduos com faixa etária igual ou superior a 60 anos em uma sociedade em relação às faixas etárias menores.
Sendo assim, para a Organização Mundial da Saúde (OMS), em seu relatório World Population Ageing (2019) o envelhecimento populacional representa:
“[…] uma história de sucesso, uma razão para celebrar o triunfo da saúde pública, dos avanços médicos, do desenvolvimento econômico e social sobre doenças, lesões e mortes precoces que limitaram a duração da vida humana ao longo da história”.
As causas do envelhecimento populacional
São diversos os fatores que influenciam diretamente e indiretamente para o fenômeno do envelhecimento populacional, sejam eles políticos, sociais, culturais ou de saúde. Mas, de modo objetivo, o ritmo de crescimento da população idosa está ligado à diminuição das taxas de fecundidade e natalidade em conjunto com o aumento da expectativa de vida média dos indivíduos.
Dessa forma, enfatiza-se que os países e as regiões possuem características próprias e modelos socioeconômicos diferentes, fazendo com que o envelhecimento de suas populações ocorra de modo e velocidade diferente.
De maneira geral, a maior expectativa de vida da população mundial está relacionada à melhoria no tratamento de doenças e problemas de saúde, a melhores condições e acesso ao saneamento básico, assim como melhor acesso a serviços de saúde. Nesse sentido, o desenvolvimento tecnológico foi um fator que contribuiu para que essas melhorias fossem concretizadas.
Em relação à diminuição da taxa de fecundidade (número médio de filhos que uma mulher tem até o fim de seu ciclo reprodutivo), conforme George Martine (2013), ex-diretor do Fundo de População das Nações Unidas para a América Latina e Caribe, isso ocorreu muito em vista do processo de industrialização e urbanização dos países.
Essa urbanização, ou seja, a migração de pessoas da zona rural para as cidades, possibilitou um maior acesso à educação, à serviços de saúde com melhor qualidade, à modernos métodos contraceptivos e a programas de planejamento familiar.
Assim, a taxa de fecundidade e natalidade passaram a cair na maioria dos países, especialmente a partir da segunda metade do século XX.
As consequências e desafios do envelhecimento populacional
É claro que, como a própria OMS definiu e destacamos aqui, o envelhecimento populacional pode ser considerado uma vitória e um avanço para humanidade, por representar um maior período de vida médio para as pessoas.
Contudo, é preciso ter consciência de que não adianta ter maior tempo de vida se esse tempo não puder ser aproveitado com qualidade. Nesse sentido, o envelhecimento populacional, ocasionado pelo prolongamento da vida, só pode ser visto como uma real conquista caso os anos vividos na senioridade sejam benéficos e proveitosos.
Dessa forma, a principal consequência, que é também um desafio, é assegurar que todas as pessoas idosas tenham os seus direitos fundamentais garantidos, para que tenham uma vida digna.
Esse desafio é ainda mais difícil para países que possuem uma grande desigualdade social e econômica, como no caso do Brasil, em que muitas vezes o acesso a serviços públicos de qualidade é precário.
Como resultado, a efetivação de direitos como o direito à saúde, à previdência social e à segurança podem ficar comprometidos, pelo risco do Estado não ser capaz de prover estrutura e recursos básicos a todos os idosos.
Como os países lidam com isso?
A mudança demográfica ocasionada pelo envelhecimento populacional exige que ações e medidas sejam executadas, tanto pelo Estado, quanto pela própria sociedade civil. E isso deve ser realizado de maneira local, nacional e internacional.
Por isso, a ONU decretou em dezembro de 2020, a década 2020-2030 como a Década do Envelhecimento Saudável e estabeleceu 4 áreas de ação para atingir o objetivo de garantir um envelhecimento digno:
- Mudar a forma como pensamos, sentimos e agimos com relação à idade e ao envelhecimento;
- Garantir que as comunidades promovam as capacidades das pessoas idosas;
- Entregar serviços de cuidados integrados e de atenção primária à saúde centrados na pessoa e adequados à pessoa idosa;
- Propiciar o acesso a cuidados de longo prazo às pessoas idosas que necessitem.
Nesse sentido, a OMS vê como fundamental a efetivação do chamado envelhecimento ativo. O envelhecimento ativo se refere ao processo de garantir que os idosos tenham o seu bem-estar físico, social e mental protegidos, assim como a sua cidadania.
Assim, ele visa tornar o fenômeno de envelhecer uma experiência positiva que melhore a qualidade de vida dos idosos. Para isso, uma série de políticas públicas são necessárias, sendo que, para a OMS, o foco deve ser em políticas de saúde, participação e segurança.
No âmbito da saúde, o Estado deve agir para propiciar acesso a programas e serviços de saúde e prevenção, como ambientes seguros e apropriados para idosos.
Em relação à participação, deve fornecer educação e oportunidade de aprendizagem, assim como incentivar a participação integral das pessoas idosas na vida familiar e comunitária, por meio de trabalhos formais ou voluntários.
No que se refere à segurança, é preciso assegurar uma vida digna aos idosos, por meio de direitos de segurança social, financeira e física, como por exemplo, garantir a previdência social, a justiça social e combater qualquer tipo de abuso, discriminação e maus tratos.
No caso do Brasil, a legislação nacional possui instrumentos que visam efetivar essas políticas a partir da garantia dos direitos humanos dos idosos. Como, por exemplo, o Estatuto do Idoso, o Benefício da Prestação Continuada e o Fundo Nacional do Idoso. No próximo texto vamos abordar em detalhes as suas diretrizes, então continue acompanhando o projeto!
Os números e as projeções do envelhecimento populacional
Segundo relatório World Population Prospects da ONU, publicado em 2019, a taxa de natalidade mundial caiu de 3,2 em 1990 para 2,5 em 2019 e espera-se que caia para 2,2 em 2050.
Como resultado, em 2019 o mundo atingiu a marca de 705 milhões de pessoas com 65 anos ou mais, contra 680 milhões entre 0 e 4 anos. Isso quer dizer que, pela primeira vez, o mundo teve mais “avós” do que “netos”.
Para além da queda das taxas de natalidade no mundo, o aumento da expectativa de vida também é uma realidade. De acordo com o mesmo relatório, a expectativa de vida mundial subiu de 64,2 anos em 1990 para 72,6 anos em 2019 e espera-se que suba para 77,1 anos em 2050.
E mais: o número de pessoas com 80 anos ou mais deve triplicar até 2050, de 143 milhões para 426 milhões. Naturalmente, esse aumento não será uniforme em todos os países, o que fica evidenciado pelo fato de que a expectativa de vida em países pobres em 2019 era, em média, 7,4 anos menor do que a média mundial.
No Brasil, de acordo com estudo do Instituto de Pesquisa Aplicada (IPEA), elaborado em 2021, os idosos no Brasil representavam 7,3% da população nacional em 2010, sendo que para 2100, esse número pode alcançar a marca de 40,3%.
O estudo ainda aponta que a população jovem (com menos de 15 anos) pode representar apenas 9% da população total no ano de 2100, indicando uma grande mudança demográfica no país. Esse cenário pode acontecer em vista da queda na taxa de fecundidade, que pode chegar a 1,61 em 2100, correspondendo ao nível mais baixo na história do país.
Conclusão
O envelhecimento populacional, além dos indícios mostrarem ser um fenômeno inevitável, também requer a consciência da sociedade para a sua ocorrência de maneira adequada.
Nesse sentido, precisamos garantir que os idosos sejam incluídos socialmente no processo de envelhecimento, garantindo que o exercício de sua cidadania seja respeitado. Isso exige que o Estado e a sociedade construam uma infraestrutura indispensável para os cuidados e os serviços básicos que a população idosa necessita.
No Brasil, essas ações representam um desafio, visto que por ser um país em desenvolvimento e desigual, a efetivação do bem-estar social para todos ainda não foi alcançado.
Dessa forma, ressalta-se a importância da implementação e do cumprimento dos direitos dos idosos no nosso país, resguardados em legislação específica que garante proteção integral dessa parcela da população.
E para entender exatamente quais direitos são garantidos às pessoas idosas em âmbito nacional, no nosso próximo texto vamos falar sobre a senioridade no Brasil e os direitos dos idosos. Então, fique ligado e confira!
Ah! E se quiser conferir um resumo super completo sobre o tema “Direitos dos Idosos“, confere o vídeo abaixo!
Autores:
Andreza Ometto Coury
Anne Costa Bittencourt Andrade
Eduardo de Rê
Gabriela Gomide Runha
Maria Augusta Micheletti Thiago
Paula Calheiros da Costa
Fontes:
2- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Projeções indicam aceleração do envelhecimento dos brasileiros até 2100. IPEA, 2021. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=38577&catid=10&Itemid=9>. Acesso em: 28 de janeiro de 2022.
3- KANSO, Solange. Processo de envelhecimento populacional – um panorama mundial. VIII SIMPOPET – Envelhecimento: Como pensar o trabalho, a sociedade e as cidades?, p. 1-23, 2013. Disponível em: <https://www.workshop-ded.ufv.br/wp-content/uploads/Solange-Kanso.pdf>. Acesso em: 27 de janeiro de 2022.
4- MARTINE, George et al. Urbanization and fertility decline: cashing in on structural change. IIED Working Paper, Londres, 2013. Disponível em: <https://pubs.iied.org/sites/default/files/pdfs/migrate/10653IIED.pdf?>. Acesso em: 27 de janeiro de 2022.
5- MORAES, Edgar N. et al. Características biológicas e psicológicas do envelhecimento. Revista Médica de Minas Gerais, 20(1), p. 67-73, 2010. Disponível em: <http://www.observatorionacionaldoidoso.fiocruz.br/biblioteca/_artigos/197.pdf>. Acesso em: 27 de janeiro de 2022.
6- Organização Mundial da Saúde. Envelhecimento ativo: uma política de saúde. World Health Organization; tradução Suzana Gontijo, Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2005, 60 p. Disponível em: <https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/envelhecimento_ativo.pdf>. Acesso em: 27 de janeiro de 2022.
7- Organização das Nações Unidas. World Population Ageing 2019. Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas, 2019. Disponível em: <https://www.un.org/en/development/desa/population/publications/pdf/ageing/WorldPopulationAgeing2019-Highlights.pdf>. Acesso em: 27 de janeiro de 2022.
8- Organização das Nações Unidas. World Population Prospects 2019. Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas, 2019. Disponível em: <https://www.un.org/development/desa/publications/world-population-prospects-2019-highlights.html>. Acesso em: 28 de janeiro de 2022.
9- Organização Pan-Americana de Saúde. Década do Envelhecimento Saudável 2020-2030. Disponível em: https://www.paho.org/pt/decada-do-envelhecimento-saudavel-2020-2030. Acesso em 28 de janeiro de 2022.