Entenda o que é a descriminalização do porte de drogas

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Fotografia do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF).
Imagem: JOTA.

Em maio de 2023, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) discutem o julgamento que trata da descriminalização do porte de drogas para uso recreativo. O recurso foi incluído na pauta pela ministra Rosa Weber, presidente do STF.

Veja também: Presidente do STF: como é eleito e o que faz?

Essa discussão foi iniciada em 2015 e já teve o voto de três ministros, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin, porém o caso voltou para ser votado em decorrência de um caso específico, que ocorreu em 2010.

Para que você entenda tudo sobre a descriminalização do porte de drogas e sobre o caso que deu origem a votação, acompanhe este texto que a Politize! preparou.

Veja também nosso vídeo sobre legalização das drogas!

O que é descriminalização do porte de drogas

De forma resumida, descriminalizar significa que um ato ou conduta deixou de ser considerado crime perante a lei. Dessa forma, deixa de existir punição no âmbito penal.

Quando se fala em descriminalização do porte de drogas, pretende-se dizer sobre não punir penalmente os usuários  dessas substâncias.. Dessa forma, deixa de ser responsabilidade do Direito Penal, a responsabilidade de lidar com este consumidor.

Alguns países já aderiram essa legislação, como Uruguai, Portugal, Holanda, Espanha e Canadá. O objetivo desses países era reduzir o número de presos e o consumo de entorpecentes, além de incentivar e incrementar a prevenção.

Saiba mais: Tudo sobre drogas: políticas alternativas mundo afora

Deve-se ter em mente que descriminalizar não significa o mesmo que legalizar. A legalização determina que o ato ou a conduta passaram a ser permitidos pela lei, portanto, há a regulamentação da prática e podem ser estabelecidas restrições e condições. Portanto, transfere-se para a legislação todo o processo de produção das drogas, desde o plantio até a distribuição, assim como já ocorre com bebidas alcoólicas e o tabaco, por exemplo.

Mas essa condição não significa que não haverá mais nenhum tipo de punição. Penalidades podem ser previstas  para quem descumprir as regras determinadas pela legislação. Exemplo disso é o consumo de álcool e tabaco que é legalizado, mas que não podem ser vendidos a menores de 18 anos e ainda possuem regras de produção e venda.

E o que é a despenalização?

A despenalização é a substituição da pena, ou seja, ao invés de penalizar com prisão, atribui-se outras formas de penalização. Com a despenalização, portanto, a prática não deixa de ser considerada crime, apenas altera-se a forma como será aplicada a punição.

A nova Lei de Drogas, a lei 11.343/06, é um exemplo disso. Nela, houve a revogação da lei 6.368/1976 que atribuía a pena de detenção de 6 meses a 2 anos mais aplicação de multa ao infrator. Na atual lei, a prática de compra e porte de drogas para consumo próprio não é mais penalizada com privação de liberdade. Além disso, há uma diferenciação entre usuários e traficantes. 

O porte de drogas permanece como crime, porém, o usuário que for penalizado, estará sujeito a medidas sócio-educativas, que deve ser aplicada por juizados especiais criminais.

O caso que deu origem a votação

Veja também nosso vídeo sobre os argumentos contra e a favor da legalização das drogas!

A Defensoria Pública de São Paulo apresentou um recurso favorável ao Francisco Benedito de Souza que, em 2010, foi flagrado com três gramas de maconha e foi condenado à prestação de dois meses de serviços comunitários. Os ministros do STF analisam este documento.

Há um grande impasse entre a Defensoria Pública e a Procuradoria-Geral da República (PGR). 

De um lado, a Defensoria Pública defende que essa tipificação penal fere o princípio constitucional e da vida privada. Para ela, o artigo  28 da Lei de Drogas, que diz que será aplicado penas para quem  “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal” seria uma violação de direitos individuais.

A PGR, por outro lado, diz que há constitucionalidade no artigo e manifestou-se pela criminalização do porte de drogas para consumo próprio. Ela defende que o uso de entorpecentes afeta toda a sociedade.

O argumento do PGR é que a Lei de Drogas aboliu a pena de prisão ao usuário flagrado com porte de drogas, mas ressalta que o Congresso Nacional manteve como crime o porte ou posse de drogas para consumo próprio.

Panorama geral sobre a votação

Desde que o julgamento começou, em 2015, a proposta de descriminalizar o porte de drogas já possui três votos. Os posicionamentos dos ministros que manifestaram sua posição foram:

  • Gilmar Mendes: o ministro entendeu que a descriminalização deveria valer para todos os tipos de substâncias consideradas ilícitas, além disso, votou para considerar inconstitucional o artigo 28 da lei; 
  • Roberto Barroso: restringiu seu posicionamento favorável somente a descriminalização da maconha;
  • Edson Fachin: assim como Barroso, Edson Fachin limitou seu argumento a favor somente da descriminalização da maconha.

Na discussão retomada em maio de 2023, a análise recebe o voto do ministro Alexandre de Moraes.

Ao mencionar seu voto, o ministro Gilmar Mendes apontou um levantamento de 2012 que mostra que em pelo menos 20 países em que houve a descriminalização do consumo, em nenhum deles houve aumento significativo do uso regular de drogas. Além disso, afirmou que a lei no Brasil não foi objetiva em relação à diferenciação entre usuário e traficante, pois na prática, todos acabam sendo classificados como traficantes.

No entanto, o ministro defendeu a manutenção das sanções previstas ao usuário especificamente, como advertência e comparecimento ao curso educativo.

No caso específico de Francisco Benedito de Souza, Gilmar Mendes optou por aceitar o recurso apresentado pela Defensoria Pública de São Paulo e absolver o réu por atipicidade da conduta.

Os ministros Edson Fachin e Luís Roberto Barroso seguiram, em parte, a mesma lógica que Gilmar Mendes. Quanto ao caso específico, Fachin e Barroso votaram, assim como o relator, pela absolvição de Francisco, alegando atipicidade da conduta, porém, diferentemente de Gilmar, os dois ministros limitaram seus votos à descriminalização apenas da maconha.

Isso porque Fachin considerou tomar decisões em temas de natureza penal, fora dos limites substanciais, poderia levar a intervenções judiciais desproporcionais e, ao votar, declarou que enquanto o Congresso Nacional não determina parâmetros de distinção entre traficantes e usuários, cabe ao Judiciário atuar até que haja na lei algo que preencha tal lacuna.

O ministro Barroso, em seu voto, afirmou que seu posicionamento em favor da descriminalização, não significa apoio ou incentivo ao consumo de drogas, pois para ele, o foco do debate deve ser nas formas de desincentivar o consumo, tratar os dependentes e combater o tráfico.

Além disso, o ministro acredita que a criminalização do uso da maconha para consumo pessoal fere o direito à privacidade, pois segundo ele, o Estado não deve interferir na autonomia do indivíduo, que de acordo com ele, é um valor essencial nas sociedades democráticas.

Barro avalia que a descriminalização pode ser um passo inicial para saber se essa política pública será melhor do que o que nomeou como “guerra perdida” contra as drogas.

Como funciona a política antidrogas do Brasil

A posse e o porte de drogas são considerados crimes, porém a Lei de Drogas, lei nº 11.343/2006, trouxe mudanças significativas para crimes relacionados a drogas.

Uma das mudanças principais é que o usuário tenha tratamento diferenciado, ou seja, só serão  aplicadas penas restritivas de direitos ao invés de penas privativas de liberdade para o usuário. Entretanto, o porte de drogas para consumo pessoal ainda é considerado  uma conduta criminosa.

As penas privativas de direitos elencadas no Código Penal serão aplicadas apenas quando os requisitos previstos no artigo 44 do CP forem preenchidos. A substituição ocorre quando o juiz fizer a análise da viabilidade da substituição e, então, impõe a pena na sentença.

Em resumo, a Lei de Drogas ainda pune o usuário de drogas, porém com punições mais brandas. O caráter mais brando da punição abriu discussões acerca da natureza jurídica do artigo 28 da Lei 11.343 que deixa a pena privativa de liberdade para incorporar penas alternativas. Ele afirma que:

“Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I – advertência sobre os efeitos das drogas;

II – prestação de serviços à comunidade;

III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.”

As discussões que se iniciaram foram no sentido de o que fazer em casos de reincidência, por exemplo.

Argumentos a favor e contra a descriminalização das drogas

Este é um tema que rende discussões em diversos grupos e espaços da sociedade e, de todo lado, argumentos a favor e contra são levantados. 

O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, declarou ser a favor da descriminalização das drogas. A declaração surgiu durante audiência na Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados, em abril de 2023.

Seu argumento foi de que a descriminalização é parte de uma estratégia de combate ao crime organizado e que o uso de drogas é uma questão de saúde pública, não de natureza criminal.

Além disso, em outros momentos, como em entrevista à BBC News Brasil em janeiro de 2023, Silvio Almeida já afirmou que a descriminalização das drogas é também uma forma de reduzir a pressão sobre o sistema carcerário brasileiro.

Por outro lado, um dos argumentos contra a descriminalização defende a ideia de que decidir usar drogas não é um direito individual e que afeta o coletivo. Os argumentos opostos consideram que na maioria dos casos, a família é a maior afetada quando há casos de dependência do uso de drogas.

Além disso, teme-se que, com a descriminalização, haja o aumento do consumo, do número de usuários e de dependentes, além de um possível insucesso na redução do tráfico de drogas.

E aí, conseguiu entender o que é a descriminalização do porte de drogas para uso recreativo? Deixe sua opinião nos comentários!

Referências:

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2 comentários em “Entenda o que é a descriminalização do porte de drogas”

  1. ronilson caetano leal

    tem que descriminalizar sim.porque assim vão tirar o poder dos traficantes,se a droga puder ser consumida e usada perde o status e atratividade .fazendo o preço cair. tornando-se inviável o enriquecimento através da venda dela.ao mesmo tempo sugiro auxílio pisicológico para quem quizer se livrar do vício e para que nossos jovens não as procure.jovem feliz e ocupado não procura droga.

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Faço parte da equipe de conteúdo da Politize!. Cientista social pela UFRRJ, pesquisadora na área de Pensamento Social Brasileiro, carioca e apaixonada pelo carnaval.

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05 out. 2024

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